Nos últimos anos o Brasil celebrou o acesso crescente de suas crianças e adolescentes em idade escolar as unidades educacionais do país. Em alguns casos chegamos a 98,4% de alunos matriculados, segundo dados do MEC/INEP, resultado este relativo a alunos que têm entre 6 e 14 anos de idade. O cômputo de dados da última década, apurados resultados até 2015, nos permitiu visualizar crescimento significativo, por exemplo, entre crianças na faixa pré-escolar, que até 10 anos atrás tinham apenas 72,5% de matrículas para o público entre 4 e 5 anos, chegando a atingir ao final deste período o equivalente a 89,1%. São, de fato, conquistas expressivas, no entanto, há ainda um contingente de cerca de 3,6 milhões de crianças e adolescentes nascidos em nosso país que ainda não estão matriculados e frequentando regularmente as escolas. As metas previstas para o período não foram totalmente atingidas quanto a inclusão de todos nas redes educacionais brasileiras.
A despeito disso, no entanto, por mais que os números indiquem crescimento e um débito considerável a saldar em relação àqueles que ainda não estão frequentando os bancos escolares, a educação brasileira continua sendo um fator de desigualdade mais que um elemento de real ascensão e melhoria socioeconômica.
O ponto de largada para quem entra em escolas brasileiras hoje, ainda que no mesmo dia, ano e seguindo componentes curriculares semelhantes, não oferece condições iguais para que o processo formativo seja, no mínimo, equivalente. Impera a desigualdade na base, ou seja, as escolas são muito desiguais e, com isso, replicam a injustiça social legando a quem é pobre e desassistido reduzidas possibilidades e oportunidades de evoluir, de ter melhor qualidade de vida, empregos com salários mais altos, acesso a bens, participação mais ativa na sociedade…
Os ciclos se repetem, com pequenas melhorias aqui, ali e acolá, mas na essência a escola replica os modelos já existentes e, com eles, a pobreza e a riqueza, em polos extremos, com algum acréscimo as camadas médias sendo ocasionado muitas vezes de modo artificial, por meio de programas que suplementam a renda, patrocinados pelos governantes.
Quem conta com recursos e pode pagar por uma educação de qualidade para os filhos ou, então, quem se beneficia de apadrinhamentos políticos consegue oferecer escola melhor para sua prole, ainda que não possa pagar pelos serviços privados, sendo alocado no que o estado oferece que tenha melhores resultados, como escolas militares ou técnicas. Para estes afortunados meninos e meninas, ainda que muito distante de sua consciência ou informação, criam-se desde este princípio os meios para que vivam de forma digna, com oportunidades reais de progredir, adquirir bens, ter acesso a cultura, ocupar os cargos de maior importância e melhor rendimento salarial em empregos públicos ou privados…
A situação equivale ao de uma corrida de automóveis em que alguns dos pilotos participantes contam com equipes organizadas, com os melhores equipamentos, gerenciada pelos profissionais de ponta na área, tendo a sua disposição os carros mais potentes e velozes, estando aptos para realizar a pilotagem de forma competitiva para lutar pelas primeiras posições.
Nas mesmas baterias há, no entanto, as equipes médias e as pequenas, que contam com recursos em menor proporção, profissionais menos qualificados, equipes técnicas menores, dirigentes sem o mesmo nível de formação e possibilidades, carros com motores menos potentes e sem tantas peças de reposição, contando com tempo muito menor de treinamento e preparação para dirigir seus carros de competição, ou seja, destinados a parar no meio da prova ou a ficar nas últimas posições.
E ano após ano os patrocinadores destas equipes de corrida investem sempre nas mesmas equipes e pilotos, ou seja, as demais escuderias vão sempre fazer somente número nas competições, tendo poucas ou mesmo nenhuma chance de triunfar nas corridas.
Imagine então que esta analogia com a educação brasileira equivale ao que está acontecendo todos os dias no país, em suas salas de aula, e que, neste caso, o que está em jogo é o futuro de gerações de pequenos brasileiros que não terão chance de sair do patamar onde estão para que seu amanhã seja melhor.
O que fazer então?
Abrir escolas, oferecer mais salas de aula, aumentar o público atendido é parte da resposta. O que vem a seguir é a qualidade da educação.
Estamos mensurando a evolução da educação brasileira, pública e privada, há quase 2 décadas e, nesse período, as metas a serem atingidas estão ainda muito distantes. Queremos ter desempenho equivalente ao dos países do primeiro mundo educacional, como a Finlândia e a Coréia do Sul ou, no mínimo, pareando com os melhores da América Latina, como o Chile.
Carecemos, no entanto, de vários elementos, entre os quais políticas públicas perenes, que sejam projetadas para durar independentemente do governo que estiver no comando da nação. Precisamos nos respaldar em dados confiáveis e, ao mesmo tempo, criar meios para que as melhores e mais eficientes práticas executadas em escolas brasileiras ou de outras nações possam ocorrer em qualquer escola do país. Temos hoje uma formação de professores defasada nas universidades que necessita de novos currículos, mais prática, baseada em teorias atualizadas, sem que disputas políticas e partidarismos sejam eixos determinantes da ação ou inação dos professores como tem ocorrido no país.
A infraestrutura das escolas deve ser adequada aos novos tempos, com instalações que permitam acessibilidade, uso das modernas redes de tecnologia, laboratórios e quadras, com gestores preparados e dispostos a realizar a melhor educação possível nas unidades pelas quais são responsáveis. Tudo isso, é claro, sempre com o apoio, a presença e a fiscalização da comunidade atendida. Presença esta imprescindível, mas que deve se ater a um papel de participação propositiva e não apenas crítica, ácida e em busca permanente por culpados entre os membros do corpo docente ou gestor da escola pelos resultados abaixo da crítica atingidos…
As metodologias têm que ser alteradas, com proposições claras nos documentos que estabelecem a filosofia da escola, como em seu projeto político-pedagógico, com a definição de metas claras e plausíveis a serem atingidas e real empenho de todos para que isso aconteça.
O caminho não é fácil, é longo, mas é preciso começar o quanto antes, pois o tempo passa e o Brasil vai ficando cada vez mais para trás em relação aos demais países. As consequências no mundo real são várias, causadas por esta escola que causa desigualdade, de doenças a altas taxas de criminalidade, de fome a desemprego…