Capa do livro "A menina que contava histórias "

“Nada crescia em Auschwitz. Nem grama, nem cogumelos, nem ervas daninhas, nem flores. A paisagem era poeirenta e cinza, uma terra árida. Eu pensava nisso todas as manhãs, enquanto caminhava para o trabalho, passando pelos barracões que eram os alojamentos dos homens e pela operação incessante dos crematórios.” (Minka em “A menina que contava histórias”, de Jodi Picoult, p.301)

 

Sabe aquele velhinho simpático que mora ao lado da sua casa? Seu vizinho tão amoroso e querido por todos. O homem que é sempre solícito e agradável, disponível para ajudar no que for preciso… pois é, imagine então que, em determinado momento de sua trajetória ele resolva dizer para você que ele foi um oficial nazista na 2ª Guerra Mundial e que, naquele período, foi responsável por um campo de concentração ou de extermínio, como Auschwitz, Treblinka ou Dachau… O que você faria? Como você se sentiria?

Este homem se escondeu no seu país, alterou sua identidade, mentiu para todos que ali viviam, casou-se com alguém da comunidade que também nunca desconfiou de sua verdadeira história de vida e, já bem idoso, arrependido de sua trajetória e amargurado pelos males que causou, pede a você, de ascendência judaica, que dê um fim à sua existência ajudando ele a se matar…

Pois esta é, basicamente, a trama do best-seller “A menina que contava histórias”, da escritora Jodi Picoult, um livro de ficção que, no entanto, traz relatos relacionados a Grande Guerra ocorrida entre 1939 e 1945, em especial ao que ocorreu nos campos de concentração e extermínio regidos pelos nazistas alemães, baseado em depoimentos e pesquisa realizados com sobreviventes dos horrores ali vivenciados.

Desde o final da guerra há relatos de inúmeros oficiais, soldados, colaboradores ou simpatizantes do nazismo que, tendo fugido da Alemanha, alteraram suas identidades e se estabeleceram em diferentes países, espalhando-se pelo mundo, alguns deles se estabelecendo até mesmo no Brasil, como o célebre caso de Josef Mengele, o anjo da morte de Hitler.

Estes nazistas escaparam dos tribunais que julgaram tantos outros líderes do nacional-socialismo alemão e do fascismo italiano pelas atrocidades por eles cometidas durante o conflito, entre elas, o extermínio de milhões de pessoas em campos de concentração e extermínio.

Entre suas principais vítimas estavam os judeus, cujas vítimas teriam atingido um montante equivalente a mais de 6 milhões de pessoas, o que constituiu uma perseguição étnica cujo resultado se tornou um verdadeiro genocídio.

Sage Singer, descendente de judeus, moradora de uma pequena cidade norte-americana, padeira dedicada a seu ofício é a pessoa que, por acaso, acaba descobrindo que seu vizinho idoso, Josef Weber, um respeitado membro de sua comunidade, foi um oficial nazista que comandou o extermínio de judeus e outros prisioneiros em um campo de concentração.

A avó de Sage, por sua vez, também imigrou para os Estados Unidos após a 2ª Guerra Mundial, sendo uma judia sobrevivente do Holocausto. Suas memórias daquele período, no entanto, nunca foram compartilhadas com sua neta, tamanha dor, horror e ressentimento contidos em tal período de sua vida, em que perdeu familiares e amigos.

A questão torna-se ainda mais delicada pois Weber, após o falecimento de sua esposa americana, que não sabia de sua história pregressa, quer que a justiça seja finalmente feita, com ele pagando por seus erros e pecados cometidos durante a guerra pelas mãos de alguém de origem judaica e escolhe Sage para fazer isso, revelando sua história para ela…

“Nós caminhávamos, cantávamos e fazíamos ginástica. Aprendíamos a nos alinhar em formações militares. Minha atividade favorita era o Wehrsport: macha militar, exercícios com baionetas, lançamento de granadas, cavação de trincheiras, rastejamento sob arame farpado. Isso fazia com que eu me sentisse já um soldado. Tinha tanto entusiasmo pela Juventude Hitlerista que Herr Sollemach disse a meu pai que eu poderia ser um excelente membro da SS um dia. Haveria maior elogio?” (Josef Weber em “A menina que contava histórias”, de Jodi Picoult, p.129)

O que ela deve fazer? Aceitar a incumbência e vingar seus antepassados?

Confusa e sem saber ao certo o que fazer a jovem busca apoio em organismo do governo americano destinado a, literalmente, caçar estes nazistas ainda espalhados pelo mundo, mesmo que hoje eles já sejam idosos aparentemente inofensivos, afinal, a justiça tarda, mas não deve falhar…

Para piorar, as pessoas próximas a Sage para quem ela conta o que está vivendo não acreditam que Josef Weber, este respeitável membro da comunidade seja quem ela está falando, ou seja, um carrasco nazista…

Narrativa intensa, com reviravoltas e histórias paralelas que envolvem o leitor, diferentes personagens trazendo suas memórias, “A menina que contava histórias” é um livro interessante para introduzir, nas escolas, os estudantes ao tema do holocausto, numa ação conjunta envolvendo literatura e história, ativando de modo multidisciplinar o assunto e fazendo com que as emoções trazidas na trama bem elaborada, façam com que uma nova geração de leitores entenda e sinta na pele o que aconteceu nos campos de concentração e extermínio criados pelos nazistas na 2ª Guerra Mundial.

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