“O Brasil é um dos países em que há menos estudantes resilientes, aqueles que apesar da condição de pobreza, conseguem ter bom desempenho escolar. Um estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostra só 2,1% dos alunos brasileiros com esse perfil. A pesquisa analisou resultados da última edição do PISA, maior avaliação internacional de educação feita por jovens de 15 anos. A média de resiliência entre países membros da OCDE é de 25,2%.” (Apenas 2,1% dos alunos pobres do país têm bom desempenho escolar. Artigo do Estadão, de autoria da jornalista Renata Cafardo).
Se você perguntar a um jovem brasileiro de baixa renda, na faixa dos 15 anos, o que é resiliência, é pouco provável que ele saiba o significado do termo. O mesmo pode acontecer com pessoas da mesma idade no país que tenham melhor condição econômica e, até mesmo, entre aqueles que frequentam boas escolas particulares. A probabilidade de ocorrer entre quem frequenta escolas melhores, tem acesso a recursos culturais, acessa a internet com frequência e sabe a melhor forma de usar as ferramentas digitais em seus estudos é, no entanto, menor.
A resiliência, conceito oriundo da física, esclarece que há materiais mais ou menos dotados desta condição, ou seja, de adequar-se à diferentes contextos e situações, modificando seu status ou condição inicial para um melhor estado, visando conformidade a diferentes situações vigentes na natureza ou em laboratório. No caso das pessoas, universo para o qual esta ideia foi transposta, significa dizer que, apesar de suas características originais – como os insumos da física – dentro de condições normais de temperatura e pressão, as alterações no seu entorno social as fazem adaptar-se, aprendendo a sobreviver em ambientes e condições diferentes daquelas em que vive normalmente.
Isso significa, na prática, que as escolas brasileiras não preparam, ou melhor, têm desempenho ínfimo no que se refere a preparar seus alunos para adequar-se, pela aprendizagem, a contextos diferenciados e inóspitos à primeira vista.
Falta aos alunos brasileiros, a partir desta informação captada, o tão celebrado “jogo de cintura” atribuído a todo o povo nascido no Brasil, pelo menos quando ainda estudantes, a partir do que é ensinado em escolas públicas.
Os brasileiros estão na 62ª colocação neste quesito, atrás dos vizinhos argentinos, uruguaios e chilenos, num ranking em que somente 71 nações são avaliadas por meio do PISA; alcançando menos de 10% do resultado médio obtido por países da OCDE neste quesito, que é de 25,2% contra os 2,1% obtidos por estudantes do país.
Somos menos inteligentes que os habitantes de outros países?
Não, o caso não é este. Não há inferioridade real de nenhum povo em relação a outros. Do ponto de vista biológico e físico, apesar de apresentarmos diferentes características, como cor da pele, gênero, tipo de cabelo, formato do rosto, dimensões e afins, somos todos seres humanos, capazes de muitas realizações. Americanos, japoneses, alemães, chineses, russos, franceses ou ingleses não são melhores que os brasileiros.
Padecemos sim, da famosa “síndrome de vira-lata”, criada e explicada pelo jornalista, escritor e dramaturgo Nélson Rodrigues, que faz com que os brasileiros se sintam inferiores sem que de fato sejam. O psicológico então poderia explicar este nosso fracasso educacional?
Também não. Atrapalha, é claro, mas não é um impedimento. Temos que lidar melhor com esta percepção, mas no geral, o problema é outro.
A falta de resiliência dos alunos pobres, por exemplo, está associada a qualidade ruim das escolas por eles frequentadas, segundo muitos especialistas. Escolas sem a devida infraestrutura, com professores que têm formação precária, sem incentivos por parte das famílias para ter uma vida cultural mínima, na qual, por exemplo, a leitura seja uma constante, acabam influenciando, e muito, o desinteresse, a evasão e o estudo fraco.
A consequência disso? Resultados não apenas ruins em termos de notas, mas que, no geral, influenciam tais estudantes a permanecerem em condição socioeconômica rudimentar, semelhante à de seus familiares, vivendo em condições ruins ou degradantes. O ciclo vicioso se estabelece e se repete, então, sem fim…
Tendo formação escolar de baixa qualidade, estes brasileiros irão, literalmente, lutar para sobreviver, ocupando empregos de baixa renda ou aumentando os índices de desemprego do país, ainda mais em se considerando a competição global pelos mercados, a exigir profissionais mais habilitados e talentosos não apenas em termos técnicos, mas também preparados para se relacionar com outras pessoas, dominando línguas estrangeiras, sabendo usar com maestria os novos recursos da tecnologia, conhecendo os segmentos em que atuam…
Pequenas mudanças já ajudam a melhorar as escolas, como demonstram os dados auferidos no levantamento da OCDE que revelou mais esta desoladora faceta da educação nacional. Os estudantes atestam que elementos como faltas frequentes dos docentes, perda de tempo das aulas, planejamento deficiente das aulas, professores que falam baixo e que não são escutados por seus alunos, metodologias de aula ultrapassadas e disciplinas com temas desinteressantes e descontextualizados contribuem muito para o descaso, o abandono, as faltas excessivas, o rendimento pífio.
O problema, é claro, não se resume a isso. Os professores precisam de apoio das famílias e da coordenação/direção das escolas. Sem que estes pares lhes deem suporte, num ambiente em que os alunos foram muito empoderados, ou seja, no qual o professor além de despreparado tecnicamente ainda lida com a falta de educação mínima a ser assegurada pelas famílias, no que tange a respeito, foco, ética e comportamento adequado no âmbito escolar, por um lado, e de outro, por gestores e projetos político-pedagógicos modernizados e adequados as novas demandas sociais, a possibilidade de êxito se reduz de modo considerável.
No entanto, aqui cabe mais uma importante ponderação relacionada ao tema, ou seja: há real interesse das autoridades brasileiras em efetivar uma educação de qualidade equivalente aos países com melhor educação auferidos no PISA e em outros exames?
As barreiras são muitas, portanto, para que consigamos superar esta condição precária e perdulária na educação brasileira. O débito é muito maior nesta área do que em qualquer outra e, as consequências, nefastas, não se aplicam apenas ao hoje, ao imediato, mas ao que irá ocorrer para algumas gerações futuras de brasileiros. Há, possibilidades, no entanto, para que nossos alunos se tornem mais resilientes, capazes de sobreviver a intempéries e cenários bastante desfavoráveis, é preciso não apenas investir, mas que as próprias políticas públicas na área sejam resilientes, pautadas nos modelos mais eficientes, para que se edifique um amanhã realmente próspero não apenas para a educação nacional, mas para o Brasil em sua totalidade.