Imagine um mundo onde blocos de montar e até mesmo sucata se transformam em máquinas que ganham vida, em um espaço no qual crianças se tornam pequenas inventoras de seu próprio universo tecnológico. Imaginou? Pois esse é o fascinante mundo da robótica, uma área que vai muito além de fios e engrenagens.

Em termos simples, robótica é a arte de projetar e construir robôs, que são dispositivos capazes de executar tarefas de maneira autônoma ou semiautônoma, imitando ações humanas ou realizando atividades que seriam difíceis para os seres humanos. Provavelmente agora você está imaginando que engenheiros e, no máximo, estudantes de ensino médio ou superior podem dar conta desta tarefa.

Mas, e se eu lhe dissesse que essa complexidade pode ser desvendada inclusive por crianças em idade pré-escolar? Bem-vindo à magia da robótica na educação infantil, que transforma a ciência em realidade para nossos pequenos alunos.

A Robótica na Escola

A integração da robótica nas escolas não é uma realidade distante, como se pode inicialmente pensar. Introduzida conceitualmente e por meio de projetos isolados a partir dos anos 1980, teve uma significativa evolução a partir do início deste século. Através de suas atividades, a robótica educacional já é uma ferramenta de ensino em ascensão, promovendo não apenas habilidades técnicas, mas também cognitivas e sociais.

Em muitas escolas ao redor do mundo, pequenos robôs invadem as salas de aula, transformando a maneira como as crianças aprendem. Esses dispositivos são projetados para serem simples e interativos, permitindo que mesmo os alunos mais novos possam entender os princípios básicos da programação e da engenharia, através de seus elementos básicos: mecânica, eletrônica e programação.

Nas escolas, a robótica é frequentemente utilizada para promover o aprendizado interdisciplinar. As crianças aprendem conceitos de matemática ao medir e calcular distâncias para que o robô siga um caminho; exploram a física ao entender como diferentes superfícies afetam o movimento dos robôs; mergulham nas ciências ao programar robôs para simular o comportamento de seres vivos ou explorar planetas distantes em missões simuladas, podendo aprender também a leitura e a escrita por meio das interações robóticas com as letras e palavras. E esses são apenas alguns poucos exemplos de aplicabilidade interdisciplinar da robótica.

Pequenos Criadores em Ação

Mas como exatamente a robótica pode ser adaptada para a educação infantil? Afinal, essa é uma fase em que a imaginação e a criatividade são os motores principais do aprendizado. Vamos explorar algumas experiências reais para entender o impacto dessa ferramenta mágica neste nível escolar.

A prefeitura de João Pessoa foi uma inovadora na inserção da Robótica nas escolas, tendo iniciado o processo em 1997 e evoluído desde então, a ponto de várias delas terem participado massivamente da Olímpiada Brasileira de Robótica e, posteriormente, da Copa do Mundo de Robótica (Robocup), em 2013-2014, o que gerou, inclusive, um e-book sobre a temática.

Em uma escola de São Paulo, as crianças do Jardim I e II têm acesso a kits de robótica adaptados para a sua idade. Esses kits incluem blocos grandes e coloridos que se encaixam para formar figuras como carros, animais e até mesmo personagens fantásticos. A cada semana, as crianças são desafiadas a inventar que tenha uma função específica e ainda não realizada.

Por exemplo, um grupo de alunos decidiu construir um “robô-cão” que se movimentava pelo chão, emitindo sons semelhantes a latidos. A emoção foi tanta que cada criança fez questão de colocar seu toque pessoal, adicionando orelhas de papel e um nariz feito de botão.

Outra experiência fascinante vem de uma escola em Curitiba, onde crianças de cinco anos participaram de um projeto chamado “Exploradores Robóticos”. O objetivo era simples: programar robôs para percorrer um “mundo de faz de conta” criado na sala de aula, cheio de obstáculos e desafios. Utilizando tablets, as crianças arrastavam blocos de comando para criar sequências de movimentos para os robôs.

A cada obstáculo superado, uma nova história se desenrolava, envolvendo princesas, dragões e cavaleiros. O projeto não só ensinou conceitos básicos de programação, mas também incentivou a narrativa colaborativa e a resolução criativa de problemas.

A prefeitura de Porto Alegre, a partir da aquisição de vários kits de robótica para as escolas, promoveu a confecção de um e-book com o relato das experiências das professoras, tanto no Berçário, quanto no Maternal e na Educação Infantil, além de algumas séries do Fundamental I. As experiências relatadas demonstraram diferentes formas de utilização e interação dos robôs na dinâmica escolar, bem como o engajamento e animação das crianças nas diferentes formas de contato com os robôs.

E para quem pensa que só com kits de robótica e jogos pré-montados a Robótica é possível, o projeto Robótica com Sucata, implantado por Débora Garofalo em uma escola periférica de São Paulo mostra que é possível fazer robótica com materiais alternativos e descartáveis, gera renda (é autossustentável) e colabora com o meio ambiente, tendo inclusive se tornado política pública no Estado de São Paulo.

Será apenas um modismo?

“Robokits”, Kits de Robótica, Jogos de Tabuleiro, Programa Scrach, Arduíno, Método TRON, Plataforma de simulação Open Roberta, Kit Lego Mindstorms, Robótica Passiva, Robô de Sucatas…

A robótica na educação infantil está longe de ser apenas uma moda passageira, mas se configura, cada vez mais, como uma poderosa ferramenta de ensino que tem o potencial de transformar a maneira como as crianças entendem e interagem com o mundo ao seu redor. Através de experiências reais e lúdicas, as crianças aprendem a resolver problemas, a trabalhar em equipe e a expressar sua criatividade de maneiras que antes eram inimagináveis.

Sendo mais uma ferramenta das metodologias ativas de aprendizagem, a robótica pode ser mais uma chave que abre as portas de um mundo de possibilidades infinitas de conhecimento e de aprendizagem. E porque não dizer, também de diversão!

Referências Bibliográficas

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André Codea 2 - arquivo pessoal

André Codea é professor da Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro. Escritor e palestrante em Neurociência Pedagógica, Mestre em Ciência da Motricidade Humana, Pós-graduado em Gestão Escolar e Anatomia. Autor do livro “Neurodidática. Fundamentos e princípios”, publicado pela Wak Editora.

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