
Um problema que ocupa salas, pátios, ruas e casas – e que muitas vezes não é visto, ouvido ou sentido – é a violência contra pessoas com deficiência. Elas enfrentam desafios diários que vão muito além das barreiras físicas: lidam também com o preconceito, a exclusão e, muitas vezes, com o bullying.
É preciso ir além do que os olhos veem e o corpo alcança. Acessibilidade física é importante, mas não suficiente. É essencial combater de forma contínua a discriminação, o preconceito e o capacitismo. A inclusão de pessoas com deficiência é um processo contínuo que exige o envolvimento de todos.
No ambiente familiar e escolar, é fundamental criar estratégias para identificar, prevenir e combater essas formas de violência, promovendo, de fato, a inclusão e o respeito.
Veja orientações fundamentais para promover ambientes mais inclusivos:
1 – Não basta informar, é preciso conscientizar
O primeiro passo é compreender que o bullying contra pessoas com deficiência pode se manifestar de diversas formas:
Piadas e apelidos pejorativos relacionados à condição física;
Exclusão de brincadeiras, atividades ou grupos sociais;
Imitações ou zombarias sobre a maneira de andar, falar ou se movimentar;
Agressões físicas ou psicológicas, como esconder cadeiras de rodas, muletas ou abafadores de ruído.
No caso de pessoas com deficiências intelectuais, cognitivas ou psicossociais, também são comuns situações como:
Ignorar tentativas de comunicação;
Tratar como criança, mesmo sendo adulta;
Usar linguagem infantilizada ou condescendente;
Excluir de decisões e atividades sociais;
Espalhar boatos sobre suas capacidades;
Discriminar por causa de saúde mental;
Fazer piadas sobre tratamentos psiquiátricos;
Minimizar sentimentos e necessidades;
Criticar atitudes ligadas à condição.
2 – Identificar o bullying
Fique atento a sinais que podem indicar que uma pessoa com deficiência está sendo vítima de bullying:
Comportamentais:
Isolamento, irritabilidade ou medo de ir à escola;
Queda no rendimento escolar;
Desinteresse por atividades antes prazerosas;
Machucados, roupas danificadas ou relatos indiretos.
Emocionais e psicológicos:
Sintomas de ansiedade e depressão;
Baixa autoestima, vergonha ou culpa;
Medo e insegurança em determinados ambientes;
Somatizações (dores de cabeça, estômago ou problemas de pele).
Sociais:
Isolamento mesmo com familiares ou amigos;
Dificuldade em fazer amigos ou confiar;
Mudanças na forma de se comunicar (mais retraída, agressiva ou defensiva).
3 – Estratégias de prevenção e combate
Promoção da inclusão ativa:
Adapte atividades escolares para garantir a participação de todos;
Em casa, incentive a convivência com crianças e adolescentes com e sem deficiência.
Fortalecimento da autoestima:
Valorize habilidades e incentive a autonomia;
Dê espaço para decisões e expressão de desejos.
Parceria com a escola:
Professores devem ser capacitados para identificar e enfrentar o bullying;
Valorize o Plano Educacional Individualizado (PEI);
Elabore um Plano de Acompanhamento Individual (PAI) com suporte psicológico, pedagógico e intersetorial.
Use a arte e o diálogo como aliados:
Música, teatro e contação de histórias ajudam a tratar temas como respeito e diversidade;
Leituras e filmes que abordam a deficiência de forma positiva geram empatia.
Denuncie e tome atitudes:
Jamais minimize situações de bullying;
Converse com a escola, busque mediação e, se necessário, envolva órgãos de proteção.
4 – Adaptação de ambientes para prevenir riscos
No ambiente familiar:
Garanta um espaço físico e emocionalmente seguro;
Adapte móveis e brinquedos para participação ativa;
Esteja atento a recusas frequentes para sair (pode haver uma causa ligada ao bullying).
Na escola:
A estrutura deve ser acessível: rampas, banheiros adaptados e salas com mobilidade;
Supervisione espaços onde o bullying costuma ocorrer, como pátios e corredores.
5 – Empoderamento por meio da comunicação e autodefesa
Em casa:
Ensine frases de autodefesa como: “Não gosto quando você fala isso. Pare, por favor.”
Estimule a expressão de sentimentos por meio de desenhos, conversas ou diários.
Na escola:
Crie códigos de alerta entre o aluno e o professor para sinalizar situações de desconforto;
Promova rodas de conversa sobre bullying e estratégias de enfrentamento.
6 – Mediação de conflitos com foco na reparação
Em casa:
Evite reações impulsivas ao saber de casos de bullying;
Se for o caso de a pessoa com deficiência praticar bullying, trabalhe a empatia com exemplos concretos.
Na escola:
Adote práticas de justiça restaurativa, incentivando a reparação do dano;
Promova dinâmicas com a turma para desconstruir estereótipos, como o “Jogo do Elogio”.
7 – Tecnologia e redes sociais como aliadas
Em casa:
Monitore o uso das redes sociais;
Ensine a bloquear agressores e salvar provas de cyberbullying;
Explore aplicativos educativos como Mundo Adaptado ou Hand Talk.
Na escola:
Crie canais anônimos de denúncia (formulário online, e-mail etc.);
Utilize recursos como vídeos, documentários e realidade virtual para fomentar a empatia.

Victor Meirelles é arte-educador, doutorando e mestre em Psicossociologia da Saúde. Pesquisador do Instituto de Psicologia e Psiquiatria na UFRJ. Pós-Graduado em Filosofia e Direitos Humanos. Autor do livro “Bullying, qual é a graça?” Wak Editora.