Ilustração de Midas

Midas, como se sabe, era rei de um próspero país estabelecido em um local desconhecido que juntou grande fortuna em ouro. Na época em que viveu, era certamente uma das pessoas mais ricas do mundo. Acumulou fortuna e, ainda assim, vivia descontente, queria mais e mais ouro e sempre que estava só, em seu grande cofre, mencionava este desejo.

Conta a lenda, que num dia qualquer, ele recebeu uma visita, justamente quando mais uma vez destacava seu desejo por mais riqueza. Materializou-se diante dele um desconhecido. Inicialmente o rei levou um susto, mas ouviu o estranho lhe dizer que a partir da manhã seguinte, com o raiar do sol, teria o poder de tocar nas coisas e transformá-las em ouro. Tudo em que colocasse as mãos iria se tornar este valioso metal…

Esta história, contada e recontada por anos a fio, era desconhecida para Jonas, um jovem brasileiro, recém-formado, que acabara de entrar no mercado de trabalho, para atuar como administrador de empresas. Por seu destacado percurso acadêmico ele conseguira estágio numa grande multinacional e, aplicado como era, ao fim do período de testes, foi contratado em definitivo. Era apenas escriturário, mas sonhava em ser o presidente da empresa…

Jonas, no entanto, curioso como era, descobriu que seu primo Geraldo havia desenvolvido um aplicativo muito interessante e que buscava investidores. Pensando na possibilidade de enriquecer rapidamente, Jonas acumulou suas reservas, vendeu seu carro e, com este aporte inicial, tornou-se sócio de Geraldo.

O aplicativo evoluiu, tornou-se uma plataforma popularíssima na internet, a empresa dos primos prosperou, começou a desenvolver outras soluções. Geraldo se casou com Márcia, com quem namorava desde a adolescência, tiveram 3 filhos e sua esposa ajudava na empresa. Estavam ganhando um bom dinheiro. Jonas, por sua vez, usava o mínimo necessário para se manter e aplicava tudo o que podia em ações, fundos, poupança e outras formas de aumentar seu capital. Diferentemente do primo, assim que começou a ganhar dinheiro se livrou de Mônica, namorada dos tempos de faculdade, grande amor de sua vida. Não buscou mais ninguém, dedicava-se apenas a sua vida profissional. Pouco antes de terminar o namoro com Mônica, ficou sabendo que ela estava grávida dele. Pagou todo o pré-natal, ajudou no parto, adotou de imediato o bebê que viera ao mundo e que era, literalmente, a cara do pai. A pequena Carolina era encantadora e para ela nunca haveria de faltar nada, pensava Jonas.

Ainda assim continuou focado quase que totalmente no trabalho. Começou a investir em outros ramos. Na maioria dos casos com sucesso. Abriu uma pequena rede de lanchonetes que foi se expandindo e logo estava em todo o país. Comprou fazendas em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso e começou a criar gado de corte e leiteiro. Adquiriu terras nas quais havia minérios e se deu muito bem pois as jazidas eram maiores do que o que se anunciava inicialmente. Construiu indústrias que trabalhavam produtos para a construção civil e os negócios também deram muito certo, passando inclusive a exportar a maior parte do que era ali produzido.

Tornou-se uma das pessoas mais bem-sucedidas do Brasil. Era um dos homens mais ricos do país e passou a aparecer nas listas dos maiores milionários do mundo. Tinha mais dinheiro do que muitos países do mundo… Ainda assim, Jonas nunca parecia satisfeito, trabalhava como um louco. Não tinha tempo nem mesmo para ver sua filha Carolina crescer e se tornar uma linda jovem. O abandono do pai e o falecimento precoce da mãe, num acidente de automóvel, fizeram com que a menina-moça perdesse o rumo. Morava com o pai, numa mansão maravilhosa, tinha tudo o que queria, estudava nos melhores colégios do mundo, viajava 2 vezes por ano em suas férias, ganhou um automóvel caríssimo logo que tirou sua carta de motorista… Mas o tempo foi passando e ela foi ficando mais e mais triste, aproximando-se de pessoas estranhas, adotando hábitos de seus novos amigos, como abusar do álcool e de drogas.

Jonas parecia alheio a tudo, o brilho do “ouro”, ou seja, de sua fortuna, era o que mais importava para ele. Tudo o que tocava, ou melhor, todos os empreendimentos nos quais se envolvia, viravam mais e mais dinheiro. Quando se deu conta do que estava acontecendo com Carol, ela já estava internada num dos melhores hospitais do mundo, inconsciente, vítima de drogas e de um acidente de automóvel.

Jonas, alienado durante tantos anos pelo trabalho intenso em busca de mais fortuna, teve que parar diante de uma cama de hospital e rezar, algo que não fazia nunca, pois se imaginava acima do bem e do mal, distante de qualquer necessidade terrena tendo em vista sua imensa fortuna. Já figurava, então, entre os 10 homens mais ricos do mundo e, ironia do destino, comprara parte da multinacional em que começara a trabalhar logo que se formara. Apesar disso, se via ali, naquele momento, mesmo contando com todo o aparato médico do mundo, com os melhores profissionais que existiam no planeta, prostrado e frágil diante de sua filha inerte, em coma, a esperar a morte…

Pediu a Deus pela vida de sua filha… Não sabia o que deveria fazer. Foi então iluminado com a ideia de que a prosperidade de seus negócios não era o que de mais importante havia na vida humana. Que deveria se dedicar mais a sua filha e oferecer apoio a quem carecia de melhores condições de vida.

Pensou então que, se a filha conseguisse de recuperar, iria criar uma fundação que apoiasse pessoas drogadas. Imaginou também que poderia realizar doações para universidades e institutos de pesquisa que atuassem na busca pela cura de doenças graves, como a Aids e o câncer. A filantropia seria algo a que se dedicaria se tivesse uma nova chance de estar próximo de Carolina. Pensou mesmo que iria fazer dela sua parceria em todas as ações de benfeitoria que realizasse…

Horas, dias, semanas e alguns meses se passaram até que Carolina despertou do que parecia ser seu sono eterno.

Nesse meio tempo, Jonas, conhecido por muitos como o Midas moderno, apelidado desta forma por uma importante publicação financeira mundial, começara suas ações em prol do tratamento de drogados, o apoio a hospitais, o incentivo a pesquisas na busca de medicamentos e algumas outras práticas filantrópicas. Criou o Instituto Mônica Mendes, organizado para obter, financiar e auxiliar projetos educacionais, culturais e científicos, cujo nome homenageava a ex-namorada, mãe de sua filha, grande amor de sua vida que abandonara para amealhar fortuna.

A recuperação de Carolina prosseguiu e ela pôde, gradativamente, voltar a estudar, se formando e tornando-se parceira de seu pai, nos negócios e ações em prol da sociedade. Jonas diminuiu o ritmo de trabalho, reaproximou-se de seu primo Geraldo e de Márcia, passou a atribuir cargos e ações a pessoas próximas de sua confiança, sabia que os negócios ajudavam muita gente ao fomentar a economia e gerar empregos, mas entendera que o “toque de Midas” podia ser, também, uma maldição e que, em assim sendo, era preciso dedicar-se não apenas ao trabalho, mas ao que realmente constitui a maior riqueza, o ouro genuíno de nossas existências, os familiares, amigos e a promover o bem em prol de toda a sociedade.

 

Obs. Vivemos uma época em que as pessoas parecem não se lembrar mais da história de Midas. Há muita gente envolvida numa corrida insana para acumular fortuna, se esquecendo até de si mesmos, de seus familiares, amigos e de legar um pouco de seu tempo em prol de quem precisa. A filantropia, ação comum em países como os Estados Unidos, realizada por milionários e suas empresas, é uma forma de fazer com que o brilho do ouro não cegue por completo os Midas do século XXI. Que tal prática se torne mais regular em todo o mundo e, em especial, no Brasil!

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