Estamos vivendo em um mundo globalizado, de afirmação das diferenças e mudança de paradigma. O avanço da tecnologia impactou totalmente as relações sociais, a forma convivência, pensamento e comunicação, impondo às pessoas novas formas de agir.
Antigamente, a entrada nos espaços acadêmicos era marcada por mérito ou por condição social. Quem frequentava a escola era a elite econômica ou a elite cultural. Muitas das crianças estavam fora da escola, que não era um espaço democrático, onde todos os cidadãos tinham o direito de estudar. Historicamente, as escolas foram pensadas e desenhadas para um pequeno grupo de privilegiados social, econômica, política e culturalmente.
A escola, por ser um espaço público e democrático, precisa acolher as diferenças. É certo que vamos receber, no espaço escolar, uma diversidade enorme de pessoas. Não coloco o foco de minha reflexão apenas no grupo social constituído pelas Pessoas com Deficiência (PcD), mas em todos os indivíduos e grupos que – por razões distintas – ocupam uma posição social que os coloca em risco contínuo de vulnerabilidade e redução das chances de desenvolvimento humano ou em posição de preconceito ou discriminação.
Aqui podemos citar as mulheres, que ainda sofrem muito com a violência e a exploração; os negros, que são alvo de preconceito e racismo; os homossexuais, que também são alvo de violência constante e empreendem, cotidianamente, lutas para aceitação de sua condição; os diferentes povos, que sofrem com a xenofobia; os grupos religiosos, que sofrem discriminação por causa de suas crenças e por aí vai.
As dificuldades em torno da diversidade na escola
Há muitas leis que tratam de direitos específicos e de como devem ser conduzidas as ações em torno da diversidade. As desvantagens vividas por membros dos grupos que se encaixam na esfera do termo diversidade são infinitas e impossíveis de serem mapeadas porque elas acontecem no dia a dia, em alguns segundos, e somente são percebidas ou seus efeitos são sentidos por aqueles que as vivem. Para ilustrar isto, relato algumas situações inusitadas.
Era para ser uma aula de educação física fantástica. Afinal, o professor havia pensado em uma atividade com bolas coloridas, na qual trabalharia com as cores e depois com pequenas somas, atribuindo valor a cada uma. Mas uma colega nova chegou naquele dia e adivinhem? Ela era cega. Como identificaria as cores e faria as somas a partir delas?
O dia da festa das mães chegou e estava tudo maravilhoso. O teatro lotado, a decoração impecável, muita emoção e expectativa, até que dois pais chegaram de mãos dadas e se assentaram na primeira fileira.
A aula seria de trigonometria e o professor separou um vídeo muito interessante para os alunos. Mas, na hora da apresentação, não havia como traduzir o vídeo em libras e o aluno surdo ficou de fora da atividade.
A professora pediu aos alunos que colorissem o personagem com lápis de cor da pele. Mas um aluno negro disse que não estava encontrando a cor da sua pele na caixa de lápis de cor.
No dia da consciência negra, a professora confeccionou perucas de Bombril com as crianças, para fazer uma “homenagem” aos cabelos africanos.
Se você está dando risadas, indignado, estarrecido ou achando tudo inacreditável, quero te dizer que TODAS as situações relatadas acima são reais. Aconteceram em alguma escola por aí.
O que está expresso na BNCC?
A Base Nacional Comum Curricular, documento normativo que vai orientar a elaboração dos novos currículos escolares, fez questão de destacar a necessidade de a escola contribuir para aplacar toda discriminação e preconceito, dialogar com a multiculturalidade.
A convivência e respeito à diversidade deve ser uma dimensão fundamental de uma escola acolhedora. Nesse sentido, a BNCC não é só o alicerce para os futuros profissionais. É também um elemento essencial para os seres humanos e cidadãos que ajudaremos a formar nas escolas. Na hora de construir o currículo, todo o Brasil deverá se adequar às matrizes da BNCC e ao que ela propõe. Este é um grande momento de mudança. As escolas devem aproveitar esta oportunidade de mudanças, uma vez que serão abrigadas a rever seus projetos pedagógico em função da nova base.
A defesa dos direitos humanos transpassa qualquer posicionamento político ou ideológico. Por isso, são fundamentais o diálogo e o entendimento em torno da nova BNCC, com o resgate de valores essenciais para a educação, como o integral respeito aos direitos humanos no processo de formação de nossas crianças e jovens.
Atentas a isto, as escolas devem desenhar programas de formação continuada para os professores e gestores e dialogar com alunos e pais. Combater o bullying, cyberbulling e aprender a conviver são premissas essenciais de qualquer convivência humana.
Lidar com crianças com necessidades especiais, por exemplo, requer conhecimento sobre práticas diferenciadas. Adaptações curriculares, flexibilização dos tempos e espaços escolares. Trabalhos colaborativos, em grupo, são boas estratégias para garantir a inclusão dos alunos. São muitas as possibilidades, mas temos que superar as barreiras. Os preconceitos emergem, muitas vezes, por causa do medo e da inabilidade de lidar com o diferente.
A mentalidade do professor e o apoio das famílias
O mais difícil é fazer com que o professor desperte interesse e veja a necessidade de seguir novos rumos, desconstruir práticas e abrir mão de suas convicções. A maior barreira para a mudança na Educação está na mudança de mentalidade.
Nos programas de formação, é necessário também cuidar do professor. Atuar na dimensão cognitiva, com aporte teóricos, mas também em sua dimensão afetiva, emocional relacional e física. O professor hoje é marcado por muitas pressões. Faz-se necessário montar programas de formação que abarquem as várias dimensões, tendo assim uma visão do ser humano integral. É preciso CUIDAR de quem cuida.
Outro fator que tem inquietado muito os professores é a questão da indisciplina escolar. Pais ocupados, famílias com novas estruturas, ausências, tudo isto tem feito os alunos manifestarem alguns problemas em relação ao cumprimento de regras e normas.
É preciso envolver a família como parceira no processo educacional, pois a escola sozinha não dá conta de todas as demandas do ser humano. A socialização primária vem da família. As instituições sociais, como igreja, escola, vizinhança dentre outras, promovem a socialização secundária. Quando estas relações familiares não estão bem estabelecidas, a repercussão disto se manifesta nos meios sociais. Uma criança que não respeita os pais ou as regras da casa dificilmente vai respeitar as regras da escola.
Acreditamos que a maioria de nós, independente de sexo, etnia, grau de instrução, religião, região, entre outras diferenças, é a favor do respeito às diferenças e contra todas as formas variadas de preconceito e discriminação.
O caminho para construir o respeito e atacar o preconceito não consiste em desconstruir identidades e anular os indivíduos em sua própria natureza, e sim aceitá-las e aprender a conviver com elas.
Respeitar as diferenças, sejam elas quais forem, é papel de todos nós!