Infelizmente, vivemos num país em que as mulheres sofrem muito com o comportamento inadequado de muitos homens e, até mesmo, de outras mulheres. Como professores, faz parte de nossa responsabilidade abordar esse assunto com maturidade em sala de aula. Na posição de professores de línguas, somos responsáveis por levar aos alunos materiais atuais em língua inglesa para que os alunos possam refletir sobre esse tema. Uma maneira sensacional de se trabalhar o empoderamento feminino em sala de aula é usando nada mais, nada menos que as músicas dos Beatles.
A famosa e eterna banda de Liverpool é frequentemente mencionada como revolucionária, como os precursores do profissionalismo fonográfico e, também por suas baladas (gênero musical e não balada de sair à noite). Ouvindo minha coleção de CDs, DVDs e especiais dos Fab Four, percebi que muitas letras de suas músicas, principalmente as do início da banda, mostram uma força feminina muito interessante e completamente groundbreaking para aquela época. Em seu segundo disco do início da década de 60, os Beatles abrem o álbum com a música “It Won’t Be Long”. Aparentemente, se trata de uma música romântica que costumeiramente mostraria a mulher em seu papel de submissa, apaixonada por um homem e que faz de tudo para não perder o parceiro. Porém, em sua genialidade, entrando na onda do empoderamento feminino do começo dos anos 60 na Inglaterra, a letra dessa obra dos Beatles conta justamente o sofrimento de um homem que se submete a qualquer coisa pra ter sua mulher de volta. Essa ruptura de paradigma fica muito evidente quando, no refrão, eles cantam “til I belong to you” (até que eu pertença a você). No meio da mesma década, eles lançaram a música “Cry For No One” em que, mais uma vez, eles mostram a força das mulheres ao cantar a história de uma mulher que abandona o status quo da sociedade e larga do parceiro. A ruptura do comportamento tradicional fica evidente quando eles cantam “she no longer needs me”.
Historicamente, nós professores trabalhamos com o conceito de CLIL desde sempre, pois antes era por falta de materiais didáticos bem estruturados e então era necessário buscar conteúdo fora dos livros. Hoje, é pela quantidade de materiais autênticos que a internet proporciona, ou seja, estamos acostumados com a multidisciplinaridade em sala de aula. Ao contrário do que muitos dizem, CLIL não é um método de ensino, ele é uma abordagem (Marsh, 2012), uma maneira de se dar aulas e, portanto, não tem uma receita a ser seguida fielmente. A língua inglesa vai se tornar a ferramenta a ser utilizada para que os alunos consigam desempenhar as tarefas propostas dentro de um outro contexto, isto é, o novo idioma vai deixar de ser objeto do estudo e se tornar o hospedeiro da informação, do significado que vai, então, ser o objeto de estudo e análise dos alunos (Marsh, 2012). Incorporar CLIL nas aulas de língua inglesa das escolas atinge algumas vertentes do aprendizado da língua: consciência comunicativa, aprendizado da gramática, identidade. Ou seja, o resultado é a geração de alunos bilíngues ativos uma vez que eles acabam por entrar em contato com o que a língua pode realizar e não simplesmente organizar palavras e produzir frases. O aprendizado da nova língua e o conceito de bilinguísmo quebram o paradigma do ensino das palavras, números, cores, regras gramaticais, subordinações, etc, e se torna mais completo e plural com perspectivas que abrem espaço para discussões como, por exemplo, o empoderamento feminino.
Voltando as atenções aos 4 rapazes de Liverpool, é possível trabalhar questões de empoderamento das mulheres dentro de um plano de aula utilizando a multidisciplinaridade (CLIL). Músicas em sala de aula, muitas vezes, tem somente sua superfície explorada pelos professores quando promovem atividades em que os alunos precisam ouvir a música e prestar atenção somente nas palavras ou em frases que são cantadas. Uma música tem muito mais profundidade. O objetivo principal da atividade é promover a reflexão e discussão sobre o empoderamento feminino e esse tema é trabalhado nas letras das músicas dos Beatles, isto é, trata-se de uma atividade de listening que pode ter desdobramento para outras habilidades. Antes de entrar para a música em si – escolhi a “She’s Leaving Home” do álbum Sergeant Pepper’s (clássico) – é importante se lembrar de preparar os alunos. Você pode começar levantando a discussão sobre a falta de voz que as mulheres historicamente vem lutando contra, ou sobre quais atividades e comportamentos a sociedade aceitava e/ou ainda aceitam das mulheres e com relação ao conteúdo, podem ser trabalhadas algumas expressões idiomáticas (to go downstairs, to clutch an object, to step outside, to pick up, to stand alone, to break down).
“She’s Leaving Home” conta a história de uma moça que decide sair da casa de seus pais que, aparentemente, eram conservadores e fúteis para viver uma vida mais livre, em que ela possa tomar suas próprias decisões e sair da vida de aparências. Após preparar os alunos previamente, você pode realizar perguntas de compreensão com relação a música a ser tocada como “what time did she leave home?”, “did she leave a note to her parents?”, “did she take anything with her?”, “was she near her house at 9am?”. Em seguida, pode fazer transição para perguntas abertas, de interpretação como “why was she clutching a handkerchief?”, “why were her parents surprised with her attitude?”, “did she live alone because she had no friends nor siblings?”. Para finalizar, você pode fazer uma follow-up activity junto com um bring-your-own-device (BYOD) day ou pedir que os alunos a realizem em casa o trabalho de pesquisar o que a sociedade aceitava que as mulheres fizessem antes e comparem com os dias atuais. No final, os alunos pensam como eles podem conscientizar sua comunidade para que as mulheres consigam ter mais avanços na questão da igualdade de direitos e liberdades e pensar numa agenda para aplicar suas ideias.
Quando temos a mistura de 4 pessoas geniais (e gênios são atemporais) com um conceito de aula que nos permite explorar a língua em sua plena manifestação, facilitando não somente sua aquisição, mas também seu uso, o resultado é o aprendizado de uma língua que, de fato, vai ter impacto e não ficar internalizada, cheia de buracos. Independente de ser com CLIL ou qualquer outra abordagem pedagógica de ensino de línguas estrangeiras, seu aprendizado deve ser tal que os alunos possam desempenhar tarefas através da utilização desse novo idioma. Nós vivemos num país em que as mulheres ainda tem muitos problemas então, por que não usar a língua inglesa para que os alunos das novas gerações possam mudar esse cenário?