Atualmente, há leis que asseguram a obrigatoriedade do ensino da cultura e história afro-brasileiras, africanas e indígenas nas escolas. Entretanto, apesar de haver uma vontade política do governo federal para o cumprimento das leis, poucos municípios e estados demonstram esforço para uma prática efetiva. Além disso, muitos professores sentem dificuldade em desenvolver o tema.
Apesar de a população negra e mestiça constituir grande parte da sociedade brasileira, existem obstáculos que impedem e/ou dificultam um trabalho eficaz, como os livros didáticos e apostilas comumente utilizadas nas escolas, a formação precária dos professores e, principalmente, a resistência e o preconceito pautados na intolerância religiosa.
É de suma importância conscientizar os alunos acerca das práticas e representações que configuram o racismo, apresentando a eles a verdadeira história e a tradição do povo negro e indígena no Brasil, de maneira íntegra, sem estereótipos que distorcem e não retratam fielmente sua trajetória, sem mensagens subliminares que consolidam uma sociedade racista e excludente.
Desde a mais tenra idade, devemos identificar, analisar e desmistificar as relações raciais no ambiente escolar, assim como as práticas e representações do racismo no cotidiano multirracial e multicultural da escola, focalizando a constituição do estigma racial a partir da visibilidade que o indivíduo (a criança/jovem negra/mestiça) tem de si mesmo e as exterioriza.
A realidade das diferenças dos alunos nas escolas
A escola é a segunda instituição responsável pelas relações de sociabilidade de crianças e jovens, depois da família. Na escola, o aprendizado sobre as regras e valores sociais é experimentado sob a ótica do grupo. Não se trata de cada um com seus pais, e sim com seus pares, mediados pelo professor.
De uma perspectiva mais abrangente, os dados sobre escolaridade das crianças de ascendência indígena e africana, coletados pelo IBGE/PNAD, sugerem que a vida escolar dessas crianças é mais difícil e acidentada que a das crianças brancas, isto é, elas enfrentam maior número de saídas e voltas para o sistema escolar. Tanto os dados sobre o analfabetismo como os de anos de instrução formal, por cor ou raça, revelam níveis inferiores de escolaridade na população de ascendência africana e indígena.
A manutenção da diferença, quando observada em níveis econômicos semelhantes, nos leva a refletir sobre outros aspectos da dinâmica social. A literatura sociológica mais recente tem mostrado a centralidade da educação para a reprodução das desigualdades entre brancos e negros.
É urgente observar como a escola medeia as relações de diferenças e até que ponto busca proporcionar uma educação democrática e de resgatar a autoestima da etnia negra e indígena.
É preciso olhar mais de perto as experiências escolares que essas crianças e jovens vivenciam. A escola precisa aprender para propor situações de aprendizagem que considerem a presença fundamental dos negros e mestiços em nossa sociedade e, com isso, proporcionar outros encontros identitários no currículo cotidiano, mas, dessa vez, de inclusão, de sucesso e, portanto, de aprendizagens positivas.
O incentivo à literatura negra e indígena
As culturas negras e indígenas oferecem elementos relacionados a todas as áreas do conhecimento. Entretanto, através da Literatura, acessamos o mundo real e imaginário, um amplo campo de possibilidades e sensibilidade para explorar e aprofundar os sons, ritmos e significados das palavras, além de uma especial percepção das diferentes funções da linguagem.
Os livros devem ser lidos e explorados em sua totalidade através de: interpretação, análise crítica, resumos, reescritas, dramatizações etc. Cabe aos professores planejarem diferentes atividades de acordo com o nível, interesses e faixa etária de seus alunos. A contação de histórias merece lugar de destaque na sala de aula. Ela é o veículo pelo qual as crianças podem entrar em contato com um universo de lendas e mitos e enriquecer o repertório.
O trabalho literário é rico em possibilidades e, para mostrar a influência dos falares indígenas e africanos no Brasil, o professor pode lançar a proposta de construção/pesquisa de álbuns/glossários com palavras de origem africana e indígena, além de curiosidades sobre os povos e notícias da atualidade.
Em um projeto de trabalho significativo, deve-se também envolver parentes dos alunos e pessoas negras/mestiças da comunidade, pedindo que contem histórias de suas vidas. Em seguida, propor que os alunos transformem os relatos reais em textos diversos, que podem ser ilustrados com fotos e desenhos e, em seguida, lançados em uma tarde de autógrafos. Assim, desenvolvemos competentes leitores e produtores textuais orgulhosos de suas raças e histórias.
O desafio é contribuir para a construção do senso de uma sociedade mais justa e igualitária, em que pessoas de etnias diferentes não sejam discriminadas. Assim, no futuro, não será necessário fazer campanhas ou criar datas para conscientizar a população de que não há raça superior à outra, existe apenas a raça humana.
Paty Fonte – Especialista em Educação Infantil e Pedagogia de Projetos. Autora dos livros: “Projetos Pedagógicos Dinâmicos”, “Pedagogia de projetos: ano letivo sem mesmice” e “Competências Socioemocionais na escola”, publicados pela WAK Editora.